O fogo crepitava galhos secos naquela noite. O fogo aquecia e acolhia em meio àquelas terras ermas de seu próprio coração. O fogo, pai da humanidade, responsável por um mundo de inovações, ardia insólito dentro do peito. Dentro daquele mundo sombrio e de noite eterna chamado “coração”, ele havia buscado a paz. Na inocência da solidão, ele buscava acalentar a alma. Nos confins da razão, ele buscava o que houvesse restado de emoção para sua vida.
Aquele momento, em meio a escolhas e imposições, ele se senti outro, ele era o outro. Era o estrangeiro de todas as pátrias, o pária de um mundo esquecido, pois a solidão lhe ensinava a lição que levaria para toda a vida: ser só é o que somos e isso machuca muito.
Como que na superação de um ritual, ele sacrifica a própria carne, caminhando através da fogueira com pés descalços e, do outro lado, encontra o dia que não existia mais. Encontra o sol que iria lhe torrar as retinas. Encontra a luz que não salva, apenas esclarece. A salvação é apenas uma escolha e completamente posterior. Na aurora de sua própria vida, encontrou a sua própria natureza brincando, correndo naqueles descampados que se perdiam no horizonte de seu próprio coração. Ela lhe mostrava como exceder o vazio... em uma utópica dança.
Da série "estado crônico"