25 de outubro de 2011

estado crônico: a glória de uma tarde qualquer

Foi quando cortei o primeiro pedaço daquela guloseima e pus na boca que toda essa imagem se formou:



“Era meio da tarde, sol quente lá fora, mas no quarto o clima estava ameno por conta do vento que entrava pela janela. Não tinha mais de oito anos, não conseguia dormir à tarde. A TV ficava me fazendo companhia.

O cheiro de açúcar levemente queimado vinha da cozinha, para onde eu corria sempre que o sentia. Era a glória de uma tarde qualquer chegar lá e ver a babá de minha irmã mais nova finalizando aquela guloseima simples, mas que mudava todo o meu dia.

Pegava um prato, colocava três, quatro ou mesmo cinco ‘bruacas’ e corria para frente da TV na sala. Impressionante o ‘timing’ disso tudo, a sincronia de um momento perfeito, pois sempre que sentava à frente da TV estava a começar os seriados japoneses que marcaram toda uma geração. Então, vinha a música de abertura de um desses seriados, cantada simultaneamente por mim e logo em seguida, a primeira garfada. Como um pistão de alta pressão, meu coração disparava pelos altos índices de açúcar, mas tudo fazia sentido naquele momento. Eu tinha a glória, o poder e a sensação de que tudo era possível, graças a tudo isso.”


Comi em silêncio, sentado à mesa da casa de minha sogra todas as outras bruacas que ela me fez, meia-noite de sábado. Comi quase em oração, fechando os olhos, sentido que vinte anos se passaram, mas que a brisa das tarde comuns, glorificadas pelo doce sabor dessa iguaria, poderia me fazer jovem de novo, por microssegundos que ficarão guardados para sempre, por mais que o “sugar high” acabe passando logo...

***

da série "estado crônico"

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