29 de setembro de 2011

estado crônico: celestial

Deitada em sua cama em posição fetal, ela chorava há horas. O quarto era iluminado pelas luzes da noite e da lua. As cortinas longas e brancas dançavam ao vento que entrava pela janela aberta. Tudo parecia em paz, pois a vida a ensinou a chorar em silêncio, desde a infância.

Algum tempo depois, o frio da noite passou a incomodá-la mais do que ela podia suportar. Levantou-se e, com seu rosto molhado, foi até a janela. Foi então que as coisas ficaram estranhas. Sentado ao parapeito da janela havia o que parecia ser um anjo: um rosto belo, mas inexpressivo; um corpo atlético, mas com asas cinzas nas costas; e dele emanava um fluxo de energia e paz.

Assustada, ela tentou gritar, mas não conseguiu. Com uma mão a enxugar os olhos e a outra à frente para tentar tocá-lo, ela suspirou algo sobre aquilo não ser real.

"isso é tão real e ao mesmo tempo tão simbólico quanto o crucifixo que carrega pendurado no pescoço. Sou tão vivo quanto um sonho" - ouviu uma voz de sublime beleza, porém os lábios da criatura à janela não se mexiam.

Ela chegou mais perto, ainda de braço estendido, mas quando foi tocá-lo, o quarto ficou mais escuro que o normal, as pernas fraquejaram, o mundo rodou...

Na manhã seguinte, acordou assustada. Estava ela deitada em sua cama, muito bem agasalhada. Naquela manhã de outono, o quarto parecia mais claro que de costume, apesar das janelas e cortinas fechadas. Também não lembrava de ter fechado a janela. Sonho ou realidade, o crucifixo havia sumido, assim como as dores do corpo e da alma. Tomou um banho e saiu sem tomar café. Parecia satisfeita por demais para se alimentar, além de ter certeza de que aquilo que a derrubou, que a havia feito chorar nunca mais incomodaria.


***

da série "estado crônica"

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