8 de dezembro de 2012

o beijo roubado


Ele ardia de paixão quando a olhava. Não se pode ser sério aos 17 anos e o corpo dele não brincava, numa profusão de sensações intensificadas cada vez que a tocava sem querer, meio que sem jeito ou quando ela lhe fazia carinho. Nesses momentos, ele tocava os céus.

Um dia, meio de brincadeira, meio tentando ver o quanto poderia ser recíproco aquele sentimento, ele a beijou. Despretensiosamente, mas com a certeza de que aquele beijo seria retribuído.

Não foi!

Ela olhou estranho pra ele naquele momento e chamou sua atenção. Falou que ele havia entendido tudo errado e ele pediu desculpas. Sabia que teria que fazer uma escolha: ou aceitava seus sentimentos e expunha a ela o que sentia, arcando com as consequências (mesmo ela deixando claro que não o via da mesma forma), ou assumir o “erro”, declarar o mal-entendido e tentar manter a amizade de dois anos que haviam construído.

Ele assumiu o erro!

Atentem para o fato de que quando se vive o final da adolescência tudo é extremo. Semanas parecem meses, anos viram séculos e horas podem voar tão rápidas quanto podem se arrastar, só por causa da companhia que se tem (ou não) no momento.

Assim, ele tentou manter a amizade e conseguiu por um tempo, mas nunca mais falaram sobre o tal beijo.

Durante a faculdade (que faziam juntos), ela entrou em algumas ondas mais profundas, catalisadas por problemas com seu pai, que bebia cada vez mais. O velho se afundava na bebida e sempre dizia que era por culpa dela, já que o avançar da idade descortinava características que herdara da mãe, que havia falecido quando a garota ainda estava no colégio, meses antes de conhecer seu amigo, mas isso ele nunca soube. Ela já não dizia mais o que sentia, o que passava em casa, o quanto bebia, que pílulas tomava e as ondas se tornaram mais fortes, mais profundas, mais traiçoeiras.

Então, ela achou o fim!

De longe, ele se sentia assistindo a uma tragédia anunciada, mas não conseguia mais conversar com ela. Ele já estava metido em estágios, já se encaminhava pro último ano de faculdade, enquanto ela ainda repetia cadeiras por faltas e quando aparecia, notava-se visivelmente alterada.

Um dia, ela apareceu sóbria. Era final de semestre e, ao encontrá-lo, perguntou como ele estava, mas ele estava atrasado pro último dia do estágio, não lhe deu a atenção que queria. À noite, ela apareceu na casa dele, mas de novo ocupado, dessa vez com o conteúdo duas provas no dia seguinte, não conseguiu conversar com ela. Nas poucas perguntas que fez, ela se evadiu, fechou portas. Infelizmente, ele não percebeu as janelas abertas...

No dia seguinte, ligou pra casa dela logo após a primeira prova. Ninguém atendeu. Ligou de novo após a segunda. Sem respostas. Sentiu um calafrio correr por sua espinha até sua nuca e acreditou no pior.

Chegando à casa dela, encontrou uma campainha que não trazia respostas. Não se aguentou e pulou o muro como costumava fazer aos 17, quando a visitava sem que o pai dela o visse (apesar do velho nunca ter sido contra ele, na verdade, o velho gostava muito dele). Na sala, jogado no sofá, encontrou o velho com algumas latas ao redor. Encontrou também o cheiro forte de mofo, poeira e cerveja velha. 

Correu para o quarto e lá encontrou o silêncio. Ela havia partido. Um bilhete quebrava o silêncio “Eu te amo. Não me procure.”. Os armários vazios deixavam claro que o recado era para o velho. Decidiu aceitar o último conselho dela. Saiu de lá e foi para casa. Lá chorou de saudades pelo que havia vivido com ela, mas sorriu depois de um tempo, em meio às lágrimas, pois sabia que independente do caminho que seguisse, ela acharia a felicidade em sua liberdade. Ela acreditava nisso e ele precisava acreditar também.




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