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Um dia de semana, uma segunda-feira qualquer, uma noite como
qualquer outra. Fones nos ouvidos, saindo do mercado, sacolas plásticas nas
mãos e uma mureta a frente que acompanhava todo o caminho que deveria seguir. Uma
nova música começa a tocar...
Uma agradável música, com um excelente refrão, daqueles
grudentos, radiofônicos, falando sobre a lua, o sol, o romance, o verão. De
repente, um chamado...
A baixa mureta me convida a ter menos de um terço de minha
idade, convidando-me a subir nela em quase total desequilíbrio, mas não caio.
As sacolas nas mãos me servem de suporte, os passos aceleram, diminuem,
avançam, recuam em busca de equilíbrio. Um passo apressado em uma tentativa de
não cair, não há sinal de vergonha, pois o mundo mudou...
Não havia mais grama. Pensava ver, à direita e à esquerda,
não mais o chão a 40 centímetros. Havia larva, ou estacas fincadas no chão, ou
um abismo negro. Havia cenários de filmes aventurescos de tardes ociosas em
frente à TV. Com toda perícia que ainda me sobra, chego ao final da mureta. Tal
qual um saltimbanco, um rápido pulo, quase pedindo para uma plateia imaginária os
aplausos que merecia, com os braços ligeiramente erguidos, ainda carregando as
sacolas e sorrindo da travessura. Um sorriso leve e sincero de quem ainda não
morreu ou se entregou. Estou vivo...
Olho para uma das sacolas e lembro, aflito, dos ovos que
estavam lá dentro, matando o sorriso, mas não importa, pois a mureta ainda está
lá, pronta para ser revisitada em uma próxima aventura irresponsavelmente
cuidadosa.
***
da série "estado crônico"